Tradução: Vinícius Garcia
Uma entrevista não-publicada com B. F. Skinner
Emilio Ribes-Iñesta
Entrevista com B. F. Skinner (25 de janeiro de 1990)
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1) Por que você escolheu o modelo reflexo –
radicalmente modificado – para formular a taxonomia e a metodologia fundamentais
para o desenvolvimento de uma teoria sobre o comportamento?
Skinner: Eu fiquei interessado em reflexos após ler livros
de Pavlov, Sherrington e Magnus. Isso não foi uma boa preparação para minha pesquisa. Reflexos se referem às respostas de
órgãos. Minha pesquisa me levou para a
variação e seleção do comportamento do organismo como um todo.
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2) Em seus escritos, você admite que o
comportamento é ordenado – como qualquer fenômeno natural estudado pela ciência
positiva. Você pensa que essa suposição influenciou sua concepção sobre teoria
como linguagem de dados [data-language]
e o estudo do comportamento como controle tecnológico? Você pensa que dados são
independentes de teoria, ou, ao contrário, que eles são teoricamente determinados?
[Os escritos aqui mencionados são: Skinner , 1931, 1935, 1956].
Skinner: Eu admiti que o comportamento era ordenado e esse
pressuposto básico foi, sem dúvida, importante para mim em todas as fases da
minha carreira. Eu não considerei isso como um pressuposto essencial, no
entanto. Eu acho que dados são independentes da teoria, embora teorias
determinem a seleção dos dados. Essa é uma das coisas que tenho contra teorias.
Todos os dados devem ser considerados.
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3) Como você concebe sua análise do comportamento?
Como uma análise molar ou molecular? A seleção de uma propriedade
representativa do fluxo comportamental deixa em aberto ambas as interpretações.
[Nota do entrevistador: como um ponto de referência, Logan (1960) argumentou
que a distinção molar X molecular está relacionada à regra de agregação em relação
a respostas qualitativamente diferentes. O grau de restrições ao definir a
qualidade de uma resposta estabelece os limites entre uma classe molar ou
molecular. Quanto maior o número de respostas explícita e qualitativamente diferentes
em uma classe, mais molar é a definição de uma classe de respostas. Por outro
lado, a maior restrição possível consiste em especificar uma qualidade única do
responder, o que faz com que a definição dessa classe de resposta seja molecular.
O mesmo critério pode ser aplicado para analisar a distinção macro-micro como
uma agregação de comportamentos qualitativamente diferentes.]
Skinner: A distinção entre molar e molecular nunca foi
importante para mim. Ela é usada de muitas maneiras diferentes. Se ela
significa a diferença entre como o organismo funciona, algo a ser revelado eventualmente
pela fisiologia (molecular), e por que o organismo funciona dessa maneira e por
que muda de momento a momento durante a vida do indivíduo (molar), então eu estou
do lado molar. Não tenho interesse algum em como o organismo funciona.
4) Por que você considerou conceitualmente que a morfologia do comportamento – e seus
parâmetros associados, como duração, intensidade (custo), geografia e
topografia – não eram [sic] importantes quando comparados com um efeito do
comportamento – o desligar de um interruptor? Esta suposição não está em
contradição com sua abordagem do comportamento verbal?
Skinner: O comportamento operante é principalmente uma
questão de variação e seleção. Ele é selecionado por uma mudança no ambiente, e
o comportamento é mais facilmente analisado quando essa mudança é visível, como
no desligar de um interruptor. Na vida diária, ações funcionando sobre o
ambiente servem às mesmas funções, e isso é particularmente verdadeiro no campo
do comportamento verbal, onde é o efeito sobre o ouvinte que define o operante
verbal.
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5) O conceito de contingência parece a você intrínseco ao condicionamento como uma
relação necessária e/ou suficiente entre eventos, ou você o considera como uma
mera relação temporal no que diz respeito a suas propriedades funcionais?
Skinner: Eu usei a expressão ‘contingência de reforçamento’
para representar três características de uma situação: estimulação necessária
para o reforçamento, o comportamento reforçado, e a conseqüência reforçadora. As relações temporais entre estes três termos
são, certamente, muito importantes.
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6) Quais dos seus experimentos você considera decisivos
na sua carreira de pesquisa? Você poderia comentar sobre as razões de você
considerar cada um deles?
Skinner: Em ordem histórica, eu acho que o registro de uma
curva de saciedade em um registro cumulativo foi importante. Ele tornou visível
uma mudança ordenada na probabilidade do comportar-se. Igualmente importante
foi a prova de que um único reforçamento produziu uma mudança observável na
probabilidade do pressionar a barra. Isso ocorreu porque eu estava usando um
dispositivo mecânico para disponibilizar comida, e o dispositivo fazia um
barulho que, no procedimento que adotei, teve a chance de se tornar um
reforçador condicionado e ocorrer instantaneamente. Eu acho que a demonstração
de que um reforçador imediato absoluto é tão poderoso foi importante. Outro
resultado foi a demonstração do controle de estímulos sobre o responder
operante. O desenvolvimento de uma discriminação, como a extinção do
comportamento na presença de um estímulo não correlacionado com o reforçamento,
foi outro resultado. Outro ainda, foi o comportamento peculiar que obtive
quando fui capaz de estabelecer uma discriminação na qual o rato nunca
respondia ao estímulo desfavorável. Vários esquemas de reforçamento foram, a
meu ver, importantes, como os experimentos nos quais se mostrou que respostas a
duas barras interagiram de várias maneiras sob diferenciadas contingências de
reforçamento. Outros pontos, eu penso, são cobertos pelo que segue. [Nota do
entrevistador: os estudos precoces mencionados
neste parágrafo encontram-se em Skinner, 1938, e o trabalho sobre esquemas de
reforçamento é extensivamente descrito em Ferster e Skinner, 1957].
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7) Você reconhece, em alguns dos seus experimentos,
anomalias ou contradições com as descobertas fundamentais da sua pesquisa ou os
conceitos fundamentais da sua teoria?
Skinner: Muitas coisas intrigantes certamente surgiram em
minha pesquisa e muitas questões não foram ainda respondidas, mas eu não as
considero contradições, especialmente porque eu nunca estive muito interessado
em teoria.
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8) O que você pensa, nesse contexto, a respeito de
seu clássico experimento sobre superstição em pombos? Você acha que o conceito
de reforçamento deve ser aplicado tal qual ele foi definido em relação a
respostas discretas, repetitivas e predeterminadas? [Skinner, 1948]
Skinner: Eu repeti a demonstração da superstição muitas vezes,
frequentemente como uma demonstração quando palestrando para um grupo. Uma vez
que você condiciona um reforçador de modo que ele age instantaneamente, então contingências
acidentais são necessariamente efetivas. E eu tenho visto pombos fazendo muitas
outras coisas supersticiosamente, além daquelas relatadas em meu artigo. Eu não
descreveria essas coisas como discretas, repetitivas ou predeterminadas.
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9) A ênfase em contingências de reforçamento como
um fator causal fundamental não está em contradição com suas funções lógicas
disposicionais – como Gilbert Ryle as define – na medida em que elas afetam tendências
de resposta? [Ryle, 1949]
Skinner: Filósofos têm falado sobre funções disposicionais e
intenção, mas eu não estou particularmente interessado, porque um operante é
uma probabilidade de resposta, não a resposta em si, e ele é explicado por
instâncias passadas de reforçamento, não por qualquer conseqüência futura
intencional ou imaginada.
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10) Em que medida você considera que esquemas de
reforçamento e medidas e parâmetros relacionados constituem um ponto de partida
para que se possa analisar o comportamento humano? Conceitos correlativos
obtidos na pesquisa com organismos mais simples, não-sociais, perdem seu
significado e utilidade quando são extrapolados?
Skinner: Eu acredito que os seres humanos são suscetíveis à
variação e seleção representadas pelo condicionamento operante, assim como são suscetíveis
à variação e seleção representadas pela seleção natural. Mas eu não acho que
muita pesquisa possa ser feita sobre propriedades básicas do comportamento
operante com sujeitos humanos, caso eles tenham adquirido um repertório verbal.
Uma vez que uma pessoa tenha aprendido a analisar as contingências às quais está
exposta, e a formular quais são as regras essencialmente, as regras entram para
as contingências totais que afetam o comportamento. Ainda assim, creio que o
comportamento verbal e a formulação de regras como descrições de contingências de
reforçamento são nada mais que comportamento operante. Todo o comportamento
humano é ou reflexo (e, nesse caso, diz respeito a respostas de órgãos e é de
pouco interesse para mim) ou operante.
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11) Que tipo de evidência empírica ou deficiência teórica
percebida auspiciou a formulação do comportamento governado por regra?
Skinner: Meu artigo
sobre comportamento governado por regra, em 1965, foi baseado em meu livro
Comportamento Verbal, o qual não era empírico. Ele era uma interpretação do
comportamento sob a luz de fatos e princípios empíricos. Nós nos comportamos ou
porque nosso comportamento foi modelado por contingências de reforçamento, ou
porque nos foi dito, fomos avisados, ou, de outro modo, direcionados para nos
comportar, por aqueles cujo comportamento foi modelado por contingências. Acredito
que a evolução do controle operante da musculatura vocal humana é responsável pelas
realizações humanas. Não acredito que nada essencialmente novo tenha se
seguido. Simplesmente tornou-se mais fácil para o indivíduo beneficiar-se das
contingências de seleção que já afetavam outros indivíduos. [Nota do
entrevistador: Skinner, 1966, 1957].
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12) Quais limitações você percebe no operacionalismo
como uma regra lógica para desenvolver conceitos? Você acha que relações entre
operações gerais e efeitos sistemáticos dão embasamento à identificação de processos comportamentais? Você acha que
as limitações que você percebe no operacionalismo podem ser apontadas na teoria
do condicionamento tal como ela tem sido desenvolvida pelo Behaviorismo Radical?
Skinner: O positivismo lógico e o operacionismo surgiram
mais tarde que o behaviorismo. Eu penso que todos nós nos voltamos para Ernst
Mach, um físico alemão, cujo livro “A Ciência da Mecânica” me influenciou muito.
Embora eu considere minha tese uma análise operacional, eu acho que ela é mais
do que isso. Eu não estava reduzindo o reflexo para algum outro universo do discurso.
Eu o estava reduzindo a algumas observações. Isto é igualmente verdadeiro quanto ao behaviorismo radical. Diferente de Watson, eu moldei uma ciência que não aludia
à mente, mas também não aludia ao cérebro. O condicionamento operante pode ser
definido sem referências a como o corpo funciona. Ele é uma explicação do
porquê ele funciona dessa maneira. [Nota do entrevistador: Mach, 1883/1974;
Watson, 1913, 1916, 1924/1970].
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13) Você considera que sua carreira como um pesquisador
ilustra um programa de pesquisa?
Quais seriam os componentes fundamentais e critérios?
Skinner: Eu não considero meu trabalho como o efeito de um
programa. Eu não planejei com antecedência o modo como ele ocorreria. Eu
simplesmente segui uma coisa atrás de outra à medida que os dados apareciam em minha
pesquisa.
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14) Você acha que estados de privação e variáveis
históricas são adequadamente representadas em suas formulações teóricas?
Skinner: Sim, eu acho que dei a devida atenção a coisas tais
como estados de privação. Veja meus dois artigos muito precoces sobre drive e força
do reflexo [reflex strength]. (Skinner,
1932a, 1932b).
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15) Você considera que eventos privados, mais que o auto-tato,
têm um status funcional físico independente?
Skinner: Eu acho que os estados corporais que podemos observar
e chamar de emoções e sentimentos e estados de espírito, todos existem, antes
que os chamássemos assim.
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16) De acordo com você, qual é o papel a ser
desempenhado pela matematização na pesquisa e teoria do comportamento?
Skinner: Eu não acho que seja tempo para matematização na
pesquisa e teoria do comportamento, até que tenhamos dados apropriados para
esse propósito. Eu não acho que teorias matemáticas sejam úteis.
Skinner: Resumo – O que sinto falta em suas questões é de toda a noção de
variação e seleção. Eu acho que isso é
importante em três níveis: seleção natural, condicionamento operante, e a
evolução desses ambientes sociais que chamamos de culturas. Apenas o segundo
destes pode ser estudado experimentalmente no laboratório, e eu acho que
benefícios devem ser explorados tão intensivamente quanto possível.
Referências:
Link para a entrevista no original em inglês:
Senti-me um pouco incomodado com os seguintes trechos:
ResponderExcluir"Filósofos têm falado sobre funções disposicionais e intenção, mas eu não estou particularmente interessado, porque UM OPERANTE É UMA PROBABILIDADE DE RESPOSTA, não a resposta em si, e ele é explicado por instâncias passadas de reforçamento, não por qualquer conseqüência futura intencional ou imaginada."
Sempre me incomodei ao ver Skinner definir certos termos (como o de desejo) como "a PROBABILIDADE de algo". A estatística é muito importante, mas não podemos esquecer que estamos tratando de fenômenos comportamentais. Skinner às vezes parece confundir fenômenos comportamentais com fenômenos estatísticos.
"Mas eu não acho que muita pesquisa possa ser feita sobre propriedades básicas do comportamento operante com sujeitos humanos, caso eles tenham adquirido um repertório verbal."
Nossas boas pesquisas seriam só aquelas realizadas com pré-escolares? Eu sou mais otimista!
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